Paulo Tadeu Rodrigues Rosa
Juiz de Direito Titular da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais, Mestre em Direito pela UNESP e Professor da Academia de Polícia Militar.
No Estado de Direito, a liberdade é a regra e a prisão uma exceção, que somente pode ser aplicada pela autoridade judiciária competente, federal ou estadual, civil ou militar, conforme estabelece a Constituição Federal de 1988, com base nas disposições que foram enumeradas no art. 5 º, que trata dos direitos e garantias fundamentais do cidadão.
O Direito Administrativo Militar, ou como preferem alguns, Direito Administrativo Disciplinar Militar, que após a Constituição Federal de 1988, começou a ganhar força em razão do trabalho doutrinário que passou a ser realizado por estudiosos deste ramo especializado, dentre eles, Álvaro Lazzarini, Eliezer Pereira Martins e Paulo Tadeu Rodrigues Rosa, que de forma corajosa passaram a resgatar a dignidade dos integrantes do estamento militar, que deve ser observada tanto pela sociedade como pelas Instituições, com o advento do novo texto constitucional passou por modificações que ainda estão sendo incorporadas pelos diversos órgãos responsáveis pela segurança pública e nacional.
É importante se observar que o militar em decorrência das particularidades de sua profissão, que exige até mesmo o sacrifício da própria vida, fica sujeito a regramentos determinados dentre eles: o Código Penal Militar, o Código de Processo Penal Militar, e os Regulamentos Disciplinares, que na sua maioria foram editados por meio de decreto do Poder Executivo, o que fere flagrantemente o disposto na Constituição Federal de 1988, apesar de parte da doutrina pro administração, Jorge César de Assis e outros, defender a constitucionalidade destes instrumentos.
A inconstitucionalidade dos regulamentos disciplinares editados com base em decretos tem sido defendida pela doutrina especializada, como por exemplo, Eliezer Pereira Martins e Paulo Tadeu Rodrigues Rosa, que desde o advento da Constituição Federal de 1988 vislumbrou que a Constituição Federal de 1988 passou a apresentar um maior rigor técnico quando tratou dos crimes propriamente militares e das transgressões disciplinares militares, ou como prefere o Regulamento Disciplinar da Marinha do Brasil das contravenções disciplinares.
A respeito da matéria, Paulo Tadeu Rodrigues Rosa escreveu um texto, que também pode ser encontrado em sua obra, Direito Administrativo Militar –Teoria e Prática, 3ª ed, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, denominado de Regulamento disciplinar militar e as suas inconstitucionalidades, onde trata da adequação da legislação castrense aos princípios constitucionais, que devem ser observados pela administração pública militar na busca de uma efetiva aplicação da justiça, que é essencial para a construção do Estado democrático de Direito.
No intuito de combater a tese que foi defendida pelo autor, sugiram outras correntes de pensamento que passaram a defender que o texto constitucional não poderia ser interpretado daquela forma, e que os regulamentos disciplinares poderiam sim ser editados por meio de decreto. Na realidade, verifica-se uma tentativa de se negar vigência ao texto constitucional sob o argumento que tal pretensão poderia levar a quebra da hierarquia e da disciplina, o que não passa de uma falácia. Afinal, no Estado de Direito a lei é a principal fonte do Direito, e qualquer seguimento da sociedade deve observá-la e respeitá-la, sob quebra aí sim do próprio Estado de Direito que foi estabelecido pela Constituição Federal de 1988.
Neste sentido, verifica-se que a prisão de uma pessoa, nacional ou estrangeiro, que esteja em território nacional, na seara militar, somente pode ser decretada por ordem emanada de uma autoridade judiciária militar competente com base na lei. Assim, fica a seguinte indagação, Como o sistema jurídico poderá admitir uma prisão administrativa fundada em um ato praticado por autoridade administrativa que justifica a sua decisão em um regulamento disciplinar militar que não foi editado por meio de lei, mas com base um decreto proveniente do Poder executivo?
Segundo a doutrina especializada[3], qualquer modificação ocorrida após a Constituição Federal de 1988 nos regulamentos disciplinares militares somente poderá ser feita por meio de uma lei proveniente da Assembléia Legislativa ou do Congresso Nacional, sob pena de nulidade do ato, que poderá ser apreciada pelo Poder Judiciário em atendimento ao art. 5 º, inciso XXXV, da Constituição Federal. O Judiciário neste caso, para se evitar qualquer tipo de discussão tem com competência para analisar a questão, pois se trata de uma questão relacionada com os elementos extrínsecos do ato administrativo, ou seja, competência, finalidade e forma.
Na realidade, a prisão administrativa não deve ser um instrumento de mera coação, mas uma medida excepcional, devendo ser assegurado ao infrator todas as garantias processuais, para que o cerceamento da liberdade, jus libertatis quando necessário possa ser revisto pelo Poder Judiciário, que é o guardião dos direitos e garantias do cidadão.
Verifica-se desta afirmação que não se busca impedir a possibilidade da prisão administrativa. O que se defende na realidade é que a prisão administrativa não seja utilizada de forma inadequada. Por ser a sanção mais grave nesta seara do direito disciplinar deve ser aplicada somente nos casos em que a falta praticada seja de natureza grave e outros mecanismos previstos em lei não sejam suficientes para repreensão do ato praticado. Não se pode esquecer a lição que sempre esteve presente nos regulamentos disciplinares segundo a qual sanção deve levar ao aprendizado do transgressor e a sua adequação aos princípios militares.
No Estado de Minas Gerais, os legisladores preocupados com esta questão resolveram rever a existência da prisão administrativa nos regulamentos da Corporação e decidiram pela sua extinção. A medida segundo os próprios legisladores buscou a valorização do profissional de segurança pública, que no dia-a-dia enfrenta várias situações de conflito.A prisão administrativa não deve ser o único meio de resposta a ser utilizado pelo Estado na manutenção da hierarquia e da disciplina. Existem outros instrumentos que também podem ser utilizados.
Na realidade, o legislador buscou construir novos paradigmas, mas em nenhum momento se esquecer da importância da manutenção da hierarquia e da disciplina nas Instituições Militares. Uma leitura ainda que perfunctória do Código de Ética e Disciplina do Militares do Estado deixa esta questão devidamente evidenciada.
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